É lícita a contratação de pessoa jurídica para a prestação de serviços personalíssimos ou vinculados à atividade-fim da empresa?
O presente artigo pretende apontar, de forma objetiva, quais são os riscos envolvidos na contratação de pessoas jurídicas para a prestação de serviços, considerando a perspectiva fiscal-previdenciária.
As atuais modalidades de contratação de mão-de-obra, com os seus respectivos impactos previdenciários, são as seguintes:
Modalidade | Custo para a contratante | Custo para a contratada |
Pessoa física com vínculo de emprego (pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação), inclusive aquela contratada para demandas específicas (trabalho intermitente). | 25,5 a 28,8% (+ FAP) sobre o total da remuneração paga ao trabalhador. | De 7,5 a 14% da remuneração, limitado a aprox. R$ 900,00/mês. |
Pessoa física sem vínculo de emprego (ausência de qualquer um dos elementos da relação de emprego). | 20% sobre o total da remuneração paga ao trabalhador. | 11% da remuneração, limitado R$1.286,71/mês. |
Pessoa jurídica. | 11% retidos sobre a remuneração do trabalhador. | — |
Ao avaliar o impacto financeiro envolvido em cada uma das opções, é fácil deduzir que a melhor forma de contratação – tanto para a parte contratante como para a contratada – é a da pessoa jurídica. Se ainda considerássemos os aspectos trabalhistas (férias, 13º, FGTS e direitos previstos em negociações coletivas) e do imposto sobre a renda (até 27,5% retidos da remuneração das pessoas físicas), a decisão pela contratação da pessoa jurídica parece ser ainda mais acertada.
Contratação de pessoas jurídicas
No entanto, por muito tempo a contratação de pessoas jurídicas para a prestação de serviços vinculados à atividade-fim e/ou de natureza personalíssima foi presumida como uma “aventura” jurídica, diante das normas e jurisprudência relativas à matéria.
Todavia, impulsionado por milhares de processos judiciais e pela Reforma Trabalhista, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou, nos anos de 2018 e 2020 respectivamente, que a terceirização da atividade fim e a prestação de serviços personalíssimos (de natureza artística, científica e intelectual) por pessoa jurídica são medidas válidas sob a ótica da Constituição Federal
Essas decisões foram amplamente divulgadas e comemoradas pela sociedade empresarial, diante do reconhecimento do Poder Judiciário acerca da evolução do mercado de trabalho, bem como do prestígio à livre iniciativa que impulsiona a economia.
Desde então, se verifica um relevante e constante crescimento dessa forma (pessoa jurídica) de contratação da mão-de-obra.
No entanto, é muito importante ressalvar que as normas e os julgados que possibilitam a contratação de pessoas jurídicas para a prestação de serviços de qualquer natureza, não configuram “carta branca” para o desvirtuamento das reais relações de trabalho.
Terceirização da atividade-fim
Nesse sentido, transcrevemos abaixo um trecho da notícia divulgada pelo STF a respeito do julgamento da terceirização da atividade fim:
‘A presidente do Supremo destacou que a terceirização não é a causa da precarização do trabalho nem viola por si só a dignidade do trabalho. “Se isso acontecer, há o Poder Judiciário para impedir os abusos. Se não permitir a terceirização garantisse por si só o pleno emprego, não teríamos o quadro brasileiro que temos nos últimos anos, com esse número de desempregados”, salientou.’
Vê-se claramente que a permissão para a terceirização da atividade-fim e/ou a prestação de serviços personalíssimos por pessoa jurídica não admite o abuso de direito, configurado nas hipóteses em que a forma de contratação não condiz com a essência do negócio jurídico. Alguns elementos tendem a deflagrar os casos em que a contratação da pessoa jurídica não se sustenta:
- Os serviços são prestados mediante subordinação;
- O prestador dos serviços não assume o risco da atividade econômica (não possui endereço comercial, não possui contas de consumo, não possui custos com mão-de-obra, possui contrato de exclusividade com o contratante, possui dependência econômica com o contratante);
- O sócio prestador dos serviços possui outra forma de relação de trabalho, concomitantemente, com o contratante.
Dessa forma, a contratação de pessoas jurídicas para a prestação de serviços ainda demanda alguns cuidados, pois totalmente passível de questionamento e desqualificação pelos órgãos fiscalizadores (inclusive pela Receita Federal do Brasil).
Conclusivamente, a mensagem que pretendemos passar é a de quem define a forma de contratação da mão-de-obra não é a parte contratante, tampouco a parte contratada; são as características dessa relação de trabalho que o farão.
Publicado no Portal Contábeis.